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27 janeiro 2008

Reflexões de um frango

Milho. Por que sempre nos dão essa coisa para comer? Nunca vi comida pior. É um troço amarelo, duro, sem sal e com gosto estranho. Deve ser por isso que eu estou emagrecendo.

Graças a Deus que isso está acontecendo, mas eu acho que estou ficando anoréxico... aquele pneuzinho que está sobressalente tem que sumir. Meus amigos me dizem que eu estou em forma, mas a minha barriga tem que ficar de tanquinho. É para isso que eu tô malhando.

Para isso e para ver aquela franguinha gostosa fazendo abdominais, malhando as coxas, as asas, aquela bundinha... nossa! Ela me deixa completamente louco! Quando coloca aquela calça coladinha então? Minhas penas ficam todas eriçadas.

Só que eu tenho que tomar cuidado. Se eriçar demais, as penas começam a cair. É a idade chegando. Tô quase virando um galo, mas a calvície resolveu aparecer mais cedo para me atormentar. E se eu ficar igual àqueles frangos horrorosos de pescoço pelado? Nem cogito essa idéia.

Eles são muito feios. Não sei como fazem para conseguir as melhores frangas da granja. Se eu fosse o dono desse lugar, eu ia comer todos de uma só vez. Deve ser mais fácil para depenar. Eles têm menos penas...

Eles só devem conquistar todas por causa do excesso de testosterona. Aliás, frango tem testosterona? É, imagine só: um frangão bombado, com a minha tão sonhada barriga de tanque e aquele monte de galinhas ao seu redor.

E eu aqui, virgem. Vai ver porque ainda sou um frango. Mas já tive muitas oportunidades. Só que eu franguei. Irônico, não é? Eu que fui criado para ser o garanhão reprodutor da granja... na verdade, eu acho que esse é um termo para cavalos, mas deixa para lá.

Um das vezes foi quando eu estava tranqüilamente empoleirado no pé de goiaba e ela passou se insinuando. Levantou as penas da perna e mostrou aquela calcinha vermelha de renda, que servia apenas para dar uma cor ao material, de tão transparente que era.

Na primeira bobeada dela eu saí pela tangente. Aquela safada não me merecia... tudo bem, eu franguei mesmo, não agüentei toda aquela pressão. É melhor fugir que broxar. É ou não é? Fere menos o moral.

Mas acho que eu estou estranho por causa desse calor que está fazendo. Dizem que é por causa do aquecimento global. Aliás, não se fala em outra coisa no momento. Já está ficando chato: “As calotas polares estão derretendo”, “O mar vai invadir ilhas no Pacífico”. E daí? Isso é realmente um saco.

O pior são as medida que o granjeiro tomou para diminuir a emissão de dióxido de carbono na atmosfera. Olha, falei até bonito! É o efeito “Informações inúteis em excesso”. O mais revoltante é que eles proibiram o banho quente. Imaginem só, proibir o banho quente só porque ele era aquecido pela queima do carvão? Assim não dá! Vou ter que ligar para o IBAMA.

É, não seria má idéia. Será que os caras do IBAMA me levam para um lugar melhor? Um lugar onde existam galinhas selvagens (adoro as selvagens) e onde haja sombra para eu ficar deitado o dia inteiro.

É o meu sonho! Passar o dia inteiro deitado. Ser o “garanhão reprodutor” tem lá os seus defeitos. Nós temos que passar por um treinamento rígido e forçado. Forçado mesmo! Uma vez tive que cantar uma galinha gorda, cheia de celulite. E ela pensa até hoje que eu gosto dela...

Celulite não dá! Eu sei que todas as galinhas têm, mas não custa nada fazer uma massagem linfática ou algo do gênero para diminuir um pouco. Ia ser melhor e elas não tivessem. Como isso é impossível, eu me contento com as que têm pouco.

Se bem que não estou muito apto a ficar escolhendo. A primeira que passar eu vou ter que... que... é melhor não falar nada. Aí vem a gorda com celulite.

Ufa! Ainda bem que ela passou direto. Não estava nem um pouco a fim de falar com ela. Tomara que ela vire uma torta... brincadeira! Espero mesmo é que se vire frango com quiabo, ou melhor, galinha com quiabo. E, com aquele tanto de banha e celulite, o quiabo ia ficar mais babento do que o normal.

E dizem que a dona da granja cozinha muito bem. Eu é que não quero experimentar. Quando algum ser vivo entra naquela cozinha, sai de lá mais morto que... mais morto que... um frango decapitado.

Isso mesmo, como um frango decapitado! Pensando bem, quando cortam a cabeça de um frango, ele permanece vivo? Pelo menos essa é a lenda. Mas nunca nenhum frango sem cabeça voltou para contar como é a vida após a decapitação.

Pensando melhor, será que existe vida após a panela de barro? Vida de frango é tudo igual. A gente sai do ovo, vira pintinho, cresce, come, engorda, faz mais pintinhos e depois é comido. É uma emoção a cada dia. Você pode ser escolhido a qualquer hora e nem tem tempo para se despedir de sua família. É quase uma roleta-russa. O primeiro pescoço que parar diante da faca sente ela sendo enfiada.

E eu já vi isso acontecendo muitas vezes. Espero que quando chegar a minha vez seja bem rápido e indolor. Mas receber uma facada deve doer muito. Deve ser melhor ser eletrocutado.

Pois é, que tragam a cadeira elétrica para cá. E a primeira a ser queimada vai ser a gorda com celulite. Olha só, ela é muito cara de pau. Ela está voltando, rebolando aquela camada adiposa que ela insiste em chamar de bunda.

Argh! Ela piscou para mim. Não vou nem dormir essa noite. Ela é um terror. Até esqueci o que estava falando. Aliás, onde eu estava mesmo? Ah, é claro... Milho. Por que sempre nos dão essa coisa para comer?

13 janeiro 2008

Resoluções de fim de ano

Tédio, 31 de dezembro de um ano qualquer

Todo final de ano é a mesma coisa. A família inteira resolve aparecer aqui em casa, todo mundo se reúne de baixo de uma árvore e comemoram o Natal. E, menos de uma semana depois, todo mundo aparece de novo para soltar fogos e celebrara a entrada do próximo ano... que chatice!

Eu admito que eu era um dos primeiros a correr para arrumar a mesa para a ceia, um dos primeiros a correr até o pinheiro para receber. Mas esse ano está tudo muito estranho. Aliás, eu estou estranho. Sem clima para festas, se é que alguém me entende.

Os parentes estão todos lá fora, assando um churrasco, esperando ansiosamente a chegada da meia noite para, juntos, celebrarem uma nova era... falsidade. Eles se abraçam e desejam os “mais sinceros” votos de paz e felicidade.

E isso tudo com a simples esperança de que a mudança de um dia para o outro possa alterar suas vidas. “Tudo vai ser diferente nesse ano que está chegando”, dizem eles. Até parece! Um dia depois, todos vão voltar para suas rotinas medíocres, para as suas vidinhas sem graça, repletas de promessas de fim de ano que nunca serão cumpridas. “Vou emagrecer”. “Vou começar a malhar”. “Vou arrumar um bom partido”... hipocrisia pura.

Prefiro me isolar em meu quarto. Não há como compactuar com tamanha felicidade sem sentido. Não consigo sorrir, por exemplo, para minha prima que, há apenas dois meses, divorciou-se do marido só porque ele perdeu o emprego. Não consigo sorrir para aquele tio que espancou meu primo porque estava bêbado. E estão todos festejando, como se nada tivesse acontecido.

Em que vez de ficar comendo carne, todos deviam parar e refletir sobre o ano que passou. No que fizeram. Na imagem que passaram. Nas pessoas que magoaram. Naqueles em que pisaram para atingir seus objetivos fúteis e egoístas. Não, eu não fui nenhum santo no ano que está acabando. Matei, menti, destruí amizades e sonhos... e acabei com minha vida!

E é por isso que eu estou aqui refletindo. Se a famosa lista dos bonzinhos existisse, tenho certeza que eu não receberia presentes. Talvez esse tenha sido o pior ano de todos, o pior! Desgraças em série, escolhas erradas, falsas amizades e pessoas querendo passar a perna em outras.

Matei... por vingança. Ele tirou a vida da garota que eu amava. Sem explicações. Quatro tiros na cabeça... fiz o mesmo com ele.

Menti. Menti para livrar a minha cara das garras da polícia, que estava atrás de mim por esse crime.

Destruí amizades. Entreguei mus amigos em meu lugar. Era a coisa mais fácil a ser feita. A história foi meticulosamente ensaiada. Havia um papel de honra para todos eles. Foram presos, torturados e mortos na prisão.

Destruí sonhos. Muitas famílias vão passar o pior final de ano de suas vidas por minha causa. Não vou dizer que fiz tudo sem pensar porque seria a maior mentira de uma série de muitas. Pensei, calculei cada passo que eu ia dar. Nunca andei com uma venda. Estava tudo arranjado.

Não pense que não me arrependo! É por isso que estou aqui. Escrevendo para desabafar sobre as atrocidades que eu cometi. Sentindo o maior peso no coração que eu jamais senti. Meus sentimentos giram e colidem dentro da minha cabeça...

Eu simplesmente não vou mais agüentar. Esta carta é destinada para aquele parente festeiro que, por um acaso qualquer, entre nesse quarto e encontre meu corpo. Quero que saiba que essa coisa que jaz estática no chão é um homem fraco, que não soube enfrentar seus problemas e, no fim, resolveu optar pelo caminho mais simples...

Enquanto isso, eu fico aqui sentado. Sentado, olhando para o frasco de veneno que vai me levar para longe daqui. Para longe desse mundo..

Desculpem por tudo!